Pensar sobre o coração não é tarefa fácil. Falo de coração como sinônimo
de intelecto, de sede das emoções e de lugar de decisões. Falo mais de mente do
que de sangue, mas de sangue também. Falo de discernimento mais do que de
órgãos, mas disso também porque não há nada em nós que não faça parte do
coração, por isso de sua complexidade. Já disse o cronista Luiz Fernando
Veríssimo: “não se alcança o coração de ninguém com pressa”. E ele está certo.
O coração não é enxergado rapidamente, precisa de tempo para conhecê-lo e o
desbravar. Só quem tem compromisso conseguirá esperar para apreciar o coração
de alguém. Quando o profeta Samuel, direcionado pelo céu, buscava um homem na
casa de Jessé para ser o novo rei de Israel e diante das dúvidas sobre qual
opção escolher, disse Deus a ele: “não atentes para a aparência, nem para
altura ou para estatura, porque tenho rejeitado; porque o Senhor não vê como vê
o homem. Pois o homem vê o que está diante dos olhos, porém o Senhor olha para
o seu coração”. Do que Samuel precisava? De um administrador, economista,
gestor, matemático? Todos os filhos de Jessé possuíam essas competências, pois
auxiliavam diretamente o seu pai nas demandas da fazenda. Um a um dos filhos
foram analisados, mas sem sucesso e foi preciso chamar o ausente da reunião que
ainda pastoreava no pasto, Davi. Ele seria o novo rei de Israel. O ponto chave
era que Samuel não deveria tentar suprir os seus objetivos que tem a ver com o
que o olho ver, mas os objetivos de Deus que contempla o mais íntimos de cada
pessoa. Depois de algum tempo, Deus diria: “achei a Davi, filho de Jessé, homem
segundo o meu coração, que fará toda a minha vontade”. Às vezes, procuramos
mãos, mas o que devemos procurar são corações. Mãos não controlam o coração,
mas o coração controla todo o corpo. Foi o que Deus ensinou naquele dia ao
sacerdote Samuel. Certo dia, um homem foi assaltado e agredido. Lançado ao
relento e distante de tudo e todos estava a lamentar suas dores e aflições. Um
levita e um sacerdote, quando passavam pelo caminho, viram o homem esparramado
no chão, mas passaram sem aparente comoção. Por fim, um samaritano viu a cena e
se encheu de compaixão. Buscou o ferido, o levou para uma hospedaria e pagou
todos os cuidados necessários para a sua recuperação. Qual a diferença entre o
levita, o sacerdote e o samaritano nessa história? Simplesmente, o coração. As
mãos do sacerdote e do levita não puderam ser usadas porque os seus corações
não eram como o de Deus, mas o daquele samaritano, sim. E somente um coração
como o de Deus pode mover todo o corpo para a vontade do Eterno. Os olhos podem
ver, mas é com o coração que se sente. Os olhos podem me chamar à atenção para
algo, mas é o coração que fará meus pés andarem em direção ao que precisa e
fará minhas mãos agirem quando necessário. A melhor forma de governar é com o
coração. A lei existe para inibir aquilo que é ruim. Mas se tudo fosse feito
com um coração guiado por Deus, a lei se tornaria obsoleta. Costumamos apontar
erros, mas geralmente não comemoramos os acertos. Isso acontece por que o mau,
geralmente, é entendido como natural e o bom se tornou escasso. Sendo assim, de
tão natural que se tornou o mau, aquilo que é bom deveria ser entendido como
milagre e comemorado sempre que acontecesse. Enquanto o mau se configura como o
desejo do homem de sair da presença de Deus, a configuração do que é bom é o
entendimento da necessidade de se manter ligado ao criador. É preciso
contemplar os milagres à nossa volta refletidos nos muitos atos de bondade que
se espalham por todos os lugares e os comemorar para que se multipliquem. Está
escrito em Jeremias: "Enganoso é coração, mais do que todas as coisas, e
perverso; quem o conhecerá?". Em Mateus: "Porque do coração procedem
os maus pensamentos, mortes, adultérios, prostituição, furtos, falsos
testemunhos e blasfêmias". Diante de tudo isso e sendo o coração essencial
para toda boa obra é preciso seguir o exemplo do salmista: "Cria em mim, ó
Deus, um coração puro, e renova em mim um espírito reto". Disse ainda mais
o salmista: “Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e conhece as
minhas inquietações. Vê se em minha conduta algo que te ofende, e dirige-me
pelo caminho eterno”. Na epístola de João está escrito: “E nisto conhecemos que
somos da verdade e diante dele asseguramos o nosso coração”. O apóstolo Paulo,
homem que viveu muitas experiências, disse: “trago sobre o meu corpo as marcas
de Cristo”. Somos ensinados que Deus deseja todo o corpo, mas em sua sabedoria,
o Eterno inicia sua moradia em nós pelo íntimo. Ele sabe que é do coração que
“procedem as saídas da vida”, como disse Salomão. Se convencido, o coração
bombeará esperança e alegria para todo o corpo e a pessoa passará a ter
atitudes e comportamentos similares ao daquele que o convenceu e quanto mais
desejar poderá se assimilar ao seu Criador. Paulo escreveu aos efésios: “Oro
também para que os olhos do coração de
sejam iluminados, a fim de que vocês conheçam a esperança para a qual
ele os chamou”. Em Provérbios está escrito: “Dá-me, filho meu, o teu coração, e
os teus olhos observem os meus caminhos”. Coração tem a ver com qualidade de
alguém que assimila os ensinamentos do seu mestre. O bom discípulo quando
possui dúvida não recorre aos seus rabiscos como fonte inspiradora, mas àquele
que inspirou o aprendizado. Discípulos aprendem a ver o mundo com as
possibilidades do Mestre e não com as suas. Pelo conhecimento do aluno, estar
no barco é a melhor opção, mas com o respaldo do Mestre é possível sair
caminhando pelas águas. Um coração natural possui visão natural enquanto que um
coração inspirado por Deus incendeia outros corações a amar tudo o que o Mestre
ama. Ter um coração parecido com o de Jesus é olhar para os dias atuais e
enxergar esperança por que se olha não com os próprios olhos que nada veem, mas
com os olhos de quem tudo pode. Minhas mãos não conseguirão apresentar saída
para o caos, mas o coração do Mestre em mim impulsionará meu corpo para
continuar a jornada. No livro de Mateus está escrito: “Amarás o Senhor teu Deus
de todo o teu coração, com toda tua alma e com todo teu entendimento”. Há um
Salmo que diz: “guardo no coração a tua palavra para não pecar contra Ti”. O
coração do discípulo se alegra com aquilo que alegra o coração de Jesus e se
entristece com aquilo que entristece o coração do Mestre. Como estaria o
coração de Deus diante do homem caído na estrada depois de ser assaltado? Seria
como o coração do samaritano porque o samaritano possuía o coração tocado e se
assimilou ao do seu Mestre. Quando o jovem da lei indagou a Jesus acerca do que
teria de fazer para herdar a vida eterna foi respondido com outra pergunta:
“quem daqueles que viu o homem jogado ao chão depois de ser assaltado foi o seu
próximo?”. “O que o ajudou, respondeu”. Disse Jesus: “Faze isso e viverás”, ou
seja, tenha um coração como o meu para poder viver a vida que tenho preparado
para você. Escreveu Rubem Alves: “Aquilo que está escrito no coração não
necessita de agendas, porque a gente não esquece. O que a memória ama fica
eterno”. Como está o coração de Jesus diante do caos na terra? Todo discípulo
de Jesus saberá responder por que possui um coração igual ao do seu Senhor.
Para esses e os demais, Jesus continua a dizer: “Ao olhar o caos no mundo não
passe por longe, se aproxime e faça o que somente aqueles que possuem um coração
igual ao meu tem esperança para fazer. Foi para isso que pedi para morar dentro
de você”.
Fonte: Gildeon Mendonça Diácono da Igreja Assembleia de Deus em Natal e
Líder de Jovens há 16 anos.